21.1.09

_dramaníaco

O vento bateu mais forte esta tarde e o assovio das janelas me pareceram uivos de uma matilha machucada. Sempre tenho a sensação de que algo ruim e cinematográfico está para acontecer comigo quando me vejo sozinho em algum canto. Ruim, porque nasci para o drama e cinematográfico, porque sempre quero fazer um drama nascer. Estava um dia como outro qualquer, até mais ensolarado que os outros dias, mas ventava como nunca. Você sabe, talvez não, mas além de latinos e brasileiros, o estado da Florida adora receber um furacão ou outro, de vez em sempre. A sensação não era de preocupação, pelo contrário, acho que estava um pouco ansioso.

Imaginem comigo: o prédio começa a tremer, as luzes piscam e a imagem na tv fica trêmula e desliga antes que possa anunciar o estado de alerta. Os armários da cozinha se abrem e todos os talheres e louças começam a cair e quebrar ao chão, fazendo desnecessária uma trilha sonora no momento. Eu me agarro as paredes, achando que elas poderiam estar mais firmes do que eu - enganei-me. Tudo começa a cair sobre minha cabeça e antes que eu possa reagir e correr para a escada, um bloco cai sobre minha cabeça e tudo escurece. Nesse ponto, não adiantaria mostrar todo o trajeto de um soterrado, vamos para a casa de algum colega ou grupo de colegas. Casa de um amigo, todos reunidos conversando e curtindo o momento. Alguém sente a necessidade de ligar a televisão em algum momento da noite e quase que por coincidência o canal sintonizado é o da CNN. "And a building just fell to the ground in southeast Miami, more especific at the Brickell Avenue area", disse o jornalista e foi o suficiente para alertar a todos na sala. Boquiabertos e preocupados os meus colegas se alarmam e esperam pelo pior. Gritos, esperneios, ações sem sentido, falta de esperança, aperto no coração e o jornalista prossegue dizendo que "we have here at the Miami Public Hospital one of the few survivors of this awful disaster, these images may be disturbing". A imagem na tela sou eu, machucado é pouco, estaria a beira da morte ou, ao menos, estragado o suficiente para que meus colegas me reconhecessem, apenas na hora em que o repórter dissesse meu nome, por causa do passaporte que encontraram no meu casaco.

Seria uma cena e tanto, bastariam 5 minutos e eu teria feito história. Ao invés disso o meu telefone tocou, me despedi dos amigos com quem conversava no laptop e fui almoçar fora. Talvez tenha sido melhor assim. É bom estar vivo... criar e vivenciar mais alguns dramas.

3 comentários:

Unknown disse...

Caso a parede realmente tivesse caído seu corpo ainda seria uma massa celular pertencente a ti, logo, ainda seria perfeito; uma composição clara de vossa pessoa exterior e mesmo que só com o acidente você ainda assim estaria contando uma história, seja através de poemas ou número de cirurgias!
Mas não se alarme, as paredes estão caindo em nosso deredor, vejamos isso ou não, somos todos deformados, feios e o melhor de tudo....imperfeitos!
Como disse Saramago, o destino de todo papel novo É envelhecer!

Gustavo Braga disse...

alguém está ficando velho, caduco e chato como o próprio Saramago!

Unknown disse...

possibly a lie, but possibly a truth as well