29.6.09

_ Filosofário: 'crucificação'

Era destino de muitos - mesmo que hoje ainda encontremos corpos expostos para aprendermos que toda ação contrária a normalidade tem reação contrária ao nosso desejo - bandidos e excluídos. Aqueles que não detinham direito algum sobre a própria vida e muito menos a própria morte - ó terra dourada, dentre outras mil és tu mais um palco para a atrocidade contra a beleza que é respirar. Estendiam os braços, como estendem a nossa dependência, e deitavam a sola de um pé sobre as costas de outro para que ficasse claro que nunca mais andariamos por vontade própria. Era o medo de todos e a humilhação de alguns, porém foi glória de um só. (Por quê?)

23.6.09

_ cântico mutante

É sede de fome

Fome de mudança

Um novo começo

Início de esperança

Radicalização pacífica

Incenso de revolução

Renúncia do passado

Futuro sem indignação

Cada um por si

E todos pela individualidade

Salve, salve paz na humanidade

_ burro de coração

Caminhando nos passos daquele
que nunca sonhei em ser, erro, naturalmente,
pois não me é comum agir assim.

Só que o 'errado' não seria tão torturante
se eu não o soubesse.

Relatar um erro é sinal de sabedoria,
mas avisar que se está errando
- permanecendo nesta prisão -
vai além do simples ato de burrice.

Porém o amor é, dos erros simples,
aquele que marca com sequelas - sem cura.
Os amantes deveriam ser
os seres mais débeis desta terra,

mas são eles, os apaixonados, que inspiram
e aspiram o melhor do nosso mundo.
Pelo jeito eu me tornei um idiota muito feliz.

_ teia de Éden

Toda teia é circular
por mais assimétrica
que seja sua simetria

________________E de círculo em círculo
________________caminham os cegos de coração

______________________________________Girando em direção ao chão

Em queda livre se vão
________________A cada pedaço desfeito em ilusão

________________________________________Toda teia é construida

________________E por mais bela que seja
_____________________sua construtora é vil

Levando-me a acreditar que belos atos nem sempre são realizados por pessoas boas
E assim criou-se
o
Jardim
do
Éden
.

_ Jesus de Santa Maria

Santa era Maria, mãe de Jesus. Um menino pobre, de feições estranhas ao seu local de nascimento. Era menino negro em meio a um montarel de brancos. Santa Maria era de uma beleza senil e africana única, mas José, o pai, era branco como os demais e de olhos que pareciam espelhos refletindo a imensidão azul dos céus. Jesus era rejeitado, odiado e humilhado todos os dias de sua vida. Passou a negar sua própria alma, suas raízes - que não estavam mais fincadas naquele chão. Chegou a rejeitar seu parentesco santo com Maria, a mãe velha e negra. Pobre da mãe do pobre filho. Se bem que este nem mais filho era, a não ser de Deus.

8.6.09

_ tempo destemporado

No gramado se escondem as pequenas coisas que tanto buscamos. Uma viagem a um mundo desconhecido e ainda virgem, mesmo se antes fora desbravado, agora é novo, por ser diferente - neste momento. A grama tem dessas coisas, nos leva a interpretar os nossos sonhos de maneiras diferentes, visualizar um novo meio em um caminho já percorrido. É na grama que paramos para admirar as belezas do mundo, mas o mais importante é que é na grama que paramos. Parar, nos dias de hoje, é luxo para poucos. Desistir de olhar os ponteiros do relógio que giram sem parar, sem sentido algum e sem naturalismo - aplicar tempo estável ao tempo-puro, essa é a maior prova de que o homem é um ser manipulador sem escrúpulos - é quase um ato de intervenção divina. Tempo. Todo tempo tem hora. É hora de acordar e hora de dormir, hora de comer e hora de trabalhar, hora de orar e hora de matar. Cansado? Não tenho tempo pra isso, olha a hora! Nessa montanha-russa com ponteiros em movimento constante, a alavanca para brecar está nas mãos de quem?
Aquele que gira sem parar na cronológica montanha não pode enxergar o condutor, mas quem detiver o controle mental de si pode ver que o breque está em suas próprias mãos. Mãos comuns, suadas e calejadas do trabalho duro - ás vezes, do mais leve. Já foi dito: 'A voz do povo é a voz de deus', pois deus é o sistema que diz o que deve - e como deve - ser feito, dando a ilusão democrática de que alguém além dele possa decidir algo de tamanha importância comum. O sistema sabe que somos, cada um, seres com diferentes razões sociais e cores de camisetas únicas em cada tom de pele - já que pele, para mim, não define raça - e por isso trata-nos de maneira individual com o todo. 'Você, meu caro amigo, vote em mim': será que ele quer mesmo o seu voto, ou o voto de um conjunto de indivíduos, que foram transformados, tão forçadamente, em um grupo, o dos votantes. Mas isto é apenas um exemplo para a parte teórica a ser explicada.
São poucos aqueles que percebem que uma sociedade não tem direitos sobre a individualidade. Ser um individuo não é ser egoísta, mas sim ser alguém de força própria e única que poderá ser exemplo ou meio para um todo. Foram indivíduos que decidiram ser um alguém - seja lá o que isso for - , por si só, em nome da humanidade. Mesmo os movimentos anarquistas têm disso, afinal alguém que fala mais alto, que chama mais atenção ou que inspira maior número de 'fiéis', torná-se, por vontade própria ou não, um líder. Eu chamo isso de teoria do pastoreio. Onde é necessário a existência de um líder, ou pseudo-líder, que lidere as ovelhas de maneira livre, pseudo-livre ou aprisionadas - mas sempre cegamente. Na montanha-russa cronológica existem lugares reservados para aqueles que tomam a teoria do pastoreio como sua meta de vida, a qual consiste em formar a maior frente de vidas desprovidas de um futuro brilhante, para que morram em nome da vontade única de um único líder, que é descer da vida giratória e ser livre - ou seja, parar.
Assim nascem os tiranos, de sonhos belos e paradisíacos, cheios de boas intenções - o inferno ainda está cheio - e sedentos por atenção e carinhos. O problema de querer o bem, é que tudo na vida tem um ponto de vista. Eu gosto do ponto de vista do gramado, onde o céu inspira aqueles pensamentos que nem sabíamos e o sussurro da vida ao redor trás para dentro de você um pouco de esperança. Mas como eu não sou deus - muito menos o sistema -, não penso em formular uma teoria prática de como chegarmos ao paraíso, não sou tão prepotente. Afinal, a beleza está em tudo, depende apenas dos olhos de quem vê.
Enfim, parar é viver - sim, é! - um tempo impossível de se cronometrar, pois é parando (ou parados) que analisamos o mundo a nossa volta e o mundo dentro de nós. Como parar? Deite na grama, observe as formigas, seja você mesmo dentro de si próprio. Respire vida, respire fora de sincronia, respire como quiser respirar - se quiser, nem respire, mas não vá se matar... a morte é uma parada muito brusca, não leva a lugar algum. Seja um em tudo e veja o todo ser alguém, mas se tentar ser tudo em um, verá a desgraça do um acabar como ninguém - e o pior, sem tempo pra nada!

_ domingo, de novo

eu te digo:
hoje é domingo,
mas o fora ontem
e amanhã 'será'(?)

paciência de dominó
aguentando o 'para sempre'
o pasmo momento
cheio de dó

quase um dom
a inexistência temporal
travado num instante
infelizmente, domingo

comigo foi,
é e será, assim
domingo-feira todo dia
toda semana domingando

motorista domingueiro
futebol dominguista
domingo domingado
televisão, ainda mais televisiva

sétimo dia, o último
momento de descanso
nem deus aguenta domingo
ele está lá, dormindo

eu aqui, vivendo
um domingo de cada vez
domingo ontem, domingo hoje
domingo amanhã, talvez...

4.6.09

_ o conto do porco-espinho

Todo porco-espinho é solitário. Nem os parentes conseguem chegar muito perto. Quanto mais abraços querem, mais se espetam uns aos outros - e assim, mais aumenta a saudade. Não que todo porco-espinho seja mal, longe disso! Mas o seu exterior causa medo e repulsa, espantando todos os animais - incluindo os que andam em duas patas - que circulam o habitat do mesmo. Sofredor nato e carente por natureza, todo porco-espinho precisa de carinho, mas por melhores que sejam suas intenções, eles não conseguem se aproximar de ninguém. Rejeição é como a ação, sempre tem uma reação. O isolamento é a preferência nacional na terra desses pequenos mamíferos, mas há aqueles que tentam ser firmes e não arredam pé! Só que estes tornam-se carrancudos e afiados - apenas externamente - como os seus espinhos. Ninguém sabe, ninguém nunca viu, mas todo porco-espinho chora em baixo de um rarefeito rastro de luz lunar, pedindo por um alguém que pudesse estar ao seu lado. Pobre de todo porco-espinho que espera uma resposta dos céus - vazios e gélidos. Será que esperança para estes porcos que de suínos têm apenas parte de sua graça? Que ser vivente poderia suportar as espetadas dos espinhos, até descobrir que em baixo de toda aquela carcaça rústica reside um animal dócil e necessitado de atenção? Ás vezes, eu mesmo duvido da capacidade de existir alguém de tão bom coração - e sem espinhos brotando de seu corpo. Talvez exista um peixe-palhaço terrestre, que ao invés de brincar e nadar ao redor e dentro dos corais venenosos, dançaria dia e noite com um porco-espinho sortudo. Quem sabe uma borboleta? Sim! Elas são seres quase divinos. Tocam os céus com suas asas, pintando o azul celeste com suas cores distintas - únicas por serem delas e somente delas. As borboletas têm as patas delicadas o suficiente para pousar sobre os espinhos pontiagudos dos felpudos rejeitados. E foi assim, com estas delicadas palhetas aladas, que um porco-espinho pôde descobrir como é bom sentir um abraço - mesmo de patas tão pequeninas. Brincavam sobre as planícies, escondiam-se na mata e corriam pelos campos - todos são belos por serem abertos, menos os elíseos, que de campos me lembram 'concentração'. Mas como a vida é como só ela há de ser, um dia a borboleta decidiu que era hora de partir e. sem mais nem menos. soltou-se do seu espinho preferido e voou para longe. Pobre do porco-espinho, mais uma vez solitário - como a natureza parece desejar que seja. Quais serão os pensamentos deste pequeno? O que sobrou para ele? Pela primeira vez, ele acreditou que existia alguém que não temia ficar ao seu lado. Que besteira a dele acreditar que alguém realmente gostaria de um espinhudo - e ele era, muito. Talvez fosse melhor permanecer como antes: sozinho e de coração vazio. Agora? Agora, sabendo que existe alguém que pode lhe dar amor no mundo, a dor é descomunal. Antes, a solidão doía, mas agora tornava-se insuportável. Ele sabe que as leis da natureza são imutáveis e não lhe é permitido obrigar a borboleta a voltar para si, então o máximo que pode desejar é um bom caminho para sua antiga colega - que se vá em paz. Mas que vá depressa, pois não irá se segurar por muito tempo - quer mudar de idéia, sem dúvida. História sem final feliz aos olhos de quem vê; Conto de fadas como qualquer outro aos olhos de quem vai vivendo; Esperança de, um dia, encontrar a sua própria borboleta. Este é o pensamento daqueles que sentem e vivem seus sentimentos. Nada é eterno, nem o amor, - 'posto que é chama' - pois a lei da natureza é essa, somos recicláveis e assim devem ser nossas histórias e nossos sentimentos. Um dia a borboleta azul vai embora, mas que venha a borboleta vermelha e, senão, venha um novo dia e um novo começo - ponto final não é finalista, no sentido de bloquear a continuidade, é a informação de que um novo começo está por vir (sem ponto final)

_ Filosofário: 'música'

Combinação de sons e silêncios. Toque incessante de notas sem sentido, bloqueadas e intercaladas por astutos e definidos vácuos sonoros. Já foi dito que música acalma as bestas. Pois eu mesmo, uma besta, me acalmo ao ouvir as mais belas notas e os mais pesados timbres sendo batidos e rebatidos pelo meu timpano. Dizem que ouço-a muito e quando não é muito temporal é muito em altura. Se ficar surdo um dia - idade chega para todos - não vou me deprimir pela indisponibilidade de escutar violinos chorosos ou guitarras berrantes. Afinal, o segredo da música é o que não se pode ouvir.

_ (tent)ando

tentando:

____ando

num caminho sem volta

________________volta

atrás de todas decisões

_trás

lembranças horripilantes;

________________antes

eu tivesse paciência pra lidar

_____________________dar

mais de mim e esperar menos

______________________nos

outros e dos outros ao meu redor

_________________________dor!

doída e incomoda como há de ser

__________moda?

a coisa é séria, mexe com os sentimentos

_________seria

fácil, posto que não fosse doloroso

______________não

tenho como sair daqui

_______________aqui

eu encontro paz, quando não há guerra

______________________________erra,

mas quem não o faz?

__a_____m____o__.